quinta-feira, 24 de agosto de 2017

6 - As nuvens


Sempre que falo da carta das nuvens meu primeiro impulso é recorrer à metáfora da visão: há algo que não está sendo visto. As nuvens constituem um véu, um anteparo, um falsa aparência que se coloca entre aquele que precisa ver e a coisa que deve ser vista. Não se trata, entretanto, de algo que não está visível por ter sido escondido ou por portar uma natureza inacessível (como poderiam mostrar a carta da Chave ou dos Livros se acompanhadas por outras cartas de supressão e corte). Penso que o que as nuvens encobrem diz respeito ao próprio olho que vê, fala de um olhar que se distrai com o supérfulo para não ter que encarar o fundamental. A carta das nuvens convida à coragem de mirar naquilo que, de fato, precisa ser enxergado. 





René Magritte - O Espelho Falso - 1928

O hinduísmo chama o chacra frontal (Ajña) de terceiro olho e acredita-se que esse local seria consagrado à intuição e às percepções sutis. Acredito que, não poucas vezes, as nuvens convocam uma atenção especial a essa forma de visão sutil. Não a visão que tudo apreende porque se distancia e se separa das coisas, mas o olhar que quanto parte do todo, mais consegue ver. Ver é sempre questão de parcialidade e uma das grandes lições que as nuvens vem trazendo é: tudo é parcial, tudo é ponto de vista e tudo é instante. O arcano 6 vem, sobretudo, lembrar desse movimento tão necessário: menos fixação e mais movimento. Tudo passa e, só com o olhar atento a essa verdade aguda, é que se pode verdadeiramente ver. Ou, como escreveu Cecília Meireles: "Multiplica os teus olhos, para verem mais."

Nenhum comentário:

Postar um comentário